Não têm vindo boas novas do país da liberdade, nem os portugueses se comprazem com os tão badalados êxitos no cumprimento das imposições da troika.
Em época de saldos, o comércio vende, facilmente, os trapos fabricados na China, embora etiquetados com reconhecidas marcas. Os produtos estão ao preço da chuva e a maioria do povo ainda tem uns euros para comprar roupa nova a preços de há dez anos.
Talvez por isso o povo continua sereno, alimentando a paciência com rebuçados: os bens não sobem, as grandes superfícies fazem descontos em cartão aliciantes e, ninguém acredita que os próximos donos do Terreiro do Paço ditarão um futuro melhor. A experiência,infelizmente, tem provado o contrário.
Quando se julgava que a crise teria efeitos curativos nos excessos de consumo, conclui-se que esta economia parece reabilitar-se, continuando de pedra e cal, e nao há outra que se vislumbre de efeitos menos perversos.
A atividade financeira domina a actualidade informativa: os bancos, em 2013, perderam milhões, mas afiançam retomar, já no ano corrente, lucros chorudos, à custa de despedimentos e de uma ténue retoma económica.
Tudo como dantes, exceto o crescimento da pobreza que grassa por aí a olhos vistos, embora envolta em nova roupagem: automóveis parados à porta, incumprimentos dos compromissos financeiros, desemprego engravatado, cortes na alimentação, na saúde, na educação e em bens de consumo...
“Agora é que o país vive segundo as suas possibilidades” - afirmou esta semana o primeiro ministro -, agradecendo à troika a "solidariedade" com um país em crise que se dá ao luxo de pagar aos senhores do dinheiro as melhores taxas de juro do mercado!... e acrescenta-se que as ofertas excederam três vezes o montante requerido... Pudera!!!
Tudo isto acontece e é proclamado como se de um enorme feito se tratasse.
Obedientes e vergados aos ditames dos agiotas, os governantes apresentam como valor supremo, o pagamento da tremenda dívida, tudo sacrificando a esse desígnio mas menosprezando a dignidade humana.
Na implantação do paradigma ultra-liberal os "inimigos" de outrora são, paradoxalmente, os novos donos das grandes empresas privadas. Desfilam a sua opulência em tapetes vermelhos, ocupam as cadeiras de espaldar dos palácios nacionais e, com champagne estrangeiro, celebram a sua entrada na Europa do capital, através de Portugal, transformado em “república das bananas”.
A expulsão de António Capucho
Salazar não fez melhor no período ditatorial e colonial. Calou quantos questionaram a unidade do estado nas prisões e degredos e amordaçou o país que se viu forçado a emigrar para resistir à fome e ao subdesenvolvimento.
Também hoje, os críticos do regime e do partido maioritário são escorraçados, pese embora os serviços prestados à causa social-democrata. Tudo acontece sem que ninguém conteste a liderança, nem se solidarize com os rejeitados. É o discricionarismo, o requintado poder absoluto que despreza as minorias, afasta os contestários sem apelo nem agravo, ou cala os menos verticais com benesses...
No reino das oligarquias cresce a corrupção, o compadrio, a injustiça e os direitos humanos são desprezados e sonegados.
Perante estes desaforos, o povo mantém-se calado e sereno, enquanto a sua resiliência o leva, como no passado, a procurar outros destinos e novas vidas, desacreditado nos agentes do poder.
Quando os cidadãos se vêem preteridos do direito de cidadania, afastam-se para não se imiscuirem na "porca da política", como diria Bordalo Pinheiro, o que é pernicioso para as instituições e para a democracia.
Sob os olhares de gente séria e comprometida, mas impotente para demover os senhores do mando travestidos de democratas, assiste-se ao declínio da pátria esfrangalhada, que julgava poder celebrar os 40 anos de Abril em honra, dignidade e liberdade.
Pobre país este que, a troco de uns efémeros milhões, esqueceu a relevância da nossa História e a gesta dos descobrimentos que deram “novos mundos ao mundo”, impondo-se no concerto das nações.
Como será difícil reconstruir Portugal!
Voltar para Crónicas e Artigos |